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Peça teatral dos jogos Esparta x Atenas

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Jogos Esparta X Atenas fala SOBRE A PEÇA “O CASAMENTO DO PEQUENO BURGUÊS”

Nascido em 10 de dezembro de 1898, numa Alemanha pré-nazista em iminência da Primeira Guerra Mundial, o escritor Ugen Friedrich Berthold Brecht, ou simplesmente Berthold Brecht, destacou-se e atingiu legitimidade ao conduzir uma revolução estética na poesia e no teatro.

No teatro, com a teoria épica, o dramaturgo propunha a união da ciência e da arte para o benefício do pensamento crítico por parte do espectador. Para Brecht, o papel do autor dramático não se resume a reprodução histórica/social de determinado acontecimento, mas deve assumir um caráter transformador que atue sobre o indivíduo e seu ambiente social. Por esse contexto, suas obras refletem os problemas fundamentais do mundo, especialmente a luta pela emancipação social da humanidade. O teatro de Brecht é político declaradamente, um teatro a serviço da causa operária, da revolução social, daí seu caráter épico e didático. A peça “O Casamento do Pequeno Burguês”, escrita entre 1919 (1 ano após o fim da primeira Guerra Mundial) e 1926 (em plena República de Weimar, que levará à ascensão de Hitler) por isso mesmo, reflete momentos históricos de grande ebulição.

Brecht colocou-se à margem a categorização das escolas literárias e mesmo tendo passado pelo expressionismo não se acorrentou a nenhuma vertente estética “pura”. Como Shakespeare, ele soube usar, na época atual, o heroico e o lírico, o dramático e o cômico, o grave e o ridículo, dando à sua obra um sentido universal e híbrido. Rejeitando a obediência às regras métricas e estilísticas tradicionalmente estabelecidas.

LINHA DO TEMPO

1. 1913 – Berthold Brecht começou a colaborar numa revista escolar – A Colheita – escrevendo seus primeiros textos;

2. 1918 – O contato com os textos de Frank Wedekind, precursor do teatro expressionista, fez com que Brecht se inclinasse à temática da moral pequeno-burguesa, daí conheceu o teatro popular das cervejarias e a música dos cabarés alemães, que exerceram forte influência em sua formação e carreira teatral;

3. 1920 – A utopia da igualdade social e o pacifismo atraíram Brecht para o marxismo;

4. 1923 – Baal é encenada. Considerada a primeira grande peça do autor, a obra ridiculariza a decadência do teatro expressionista;

5. Final dos anos 1920 – O autor utiliza a música como um dos elementos do que chamou de Teatro Épico. Obras:A ópera de três vinténs (1928) e Ascensão e queda da cidade de Mahagonny (1928-1929);

6. 1930 – Surgem os primeiros esboços sobre a teoria do teatro épico, na qual Brecht critica o teatro burguês, classificado por ele como teatro culinário, onde o público compra emoções e estados de embriaguez, eliminando o juízo crítico; um teatro de evasão, destinado ao gozo imediato.

7. 1933 – Com o estouro da Segunda Guerra Mundial e a ascensão do Terceiro Reich, o autor se exilou do país. Suas obras foram queimadas em Berlim, bem com a de muitos escritores da época;

8. No início dos anos 1940 – Brecht critica violentamente a figura de Hitler, mostrando os crimes do nazismo em suas obras;

9. No final dos anos 1940 a 1956 – Continuou a lutar, como marxista, pela causa operária. Ao morrer, em 1956, o mundo inteiro reconhecia a grandeza de sua obra que abrange 50 peças, adaptações e fragmentos deixados por concluir.

SOBRE A OBRA: O CASAMENTO DO PEQUENO BURGUÊS (BERTOLD BRECHT, 1919)

Um casamento caracterizado pelo conflito. Amigos e familiares em posições antagônicas. Os diálogos irônicos e as acusações ganham formas e expressões nesta peça em que o dramaturgo alemão retrata a declínio do pensamento burguês. A obra instiga a reflexão sobre a moral pequeno-burguesa, especialmente os valores, tradições e conveniências estabelecidas pelas normas sociais.

O texto tem feridade e sarcasmo na análise moral da época. O autor usa o deboche como arma para compor essa comédia que transcende seu período histórico.

ANÁLISE INTEGRADA

Quem minimamente se inclina e conhece as tendências de Brecht, sabe que promover a análise de suas obras – atendo-se aqui, exclusivamente, à intitulada “O Casamento do pequeno burguês”, de 1919 – possui certa incoerência no fazer desse exame, sobretudo pela avidez com que o autor alemão rejeita as categorizações do teatro e da estética clássica. No entanto, para compreender a natureza do pensamento Brechtianos, nos valeremos da compilação das Teorias do drama burguês, do drama moderno e, principalmente do que se convencionou denominar como teatro épico, pois ambas dialogam sobre a necessária revolução do teatro clássico.

Num primeiro contato com a obra percebe-se a tendência do dramaturgo em explorar o drama burguês. Não apenas pelo título, mas essencialmente pela preocupação que Brecht tem em expressar a realidade contemporânea da época, criando personagens e adotando temas que constituíssem um elo de identificação com o cidadão comum, para que esse além de interessar-se pela ação dramática, também fosse estimulado a ter seu próprio pensamento crítico.

Verifica-se a existência desse elo na obra O Casamento do pequeno burguês, na qual a discussão sobre a degradação dos valores burgueses assume uma proximidade com o espectador – proximidade no que tange à relação entre tema e público – pois, no que compreende a narrativa da ação dramática, o autor emprega uma das veias do teatro épico, o distanciamento, para que o espectador não mergulhe no que Brecht nomeia como teatro culinário, em que o público embriagado pelo drama se destitui de senso crítico.

Tal distanciamento é percebido tanto na presença discreta do narrador, cujas expressões não estão inflamadas pela emoção, como no diálogo direto entre as personagens, que conferem um caráter dinâmico a narrativa das ações, no qual, cada cena desencadeia outra, sobretudo porque em Brecht, o personagem torna-se agente da história.

Daí também percebe-se a crítica que Brecht em relação as convenções estabelecidas ainda na aristocracia que atingiam a classe burguesa em ascensão, tais como: a renovação de aparências num casamento mal sucedido e infeliz, a questão da virgindade antes do casamento, o próprio empenho da sociedade burguesa de se afirmar perante a nobreza. Essas abordagens fazem com que a relação forma/conteúdo atinja certo grau de reciprocidade. Assim como torna-se evidente a busca do autor em “solucionar” a problemática do drama clássico no que refere-se as abordagens das temáticas aristocráticas. Aqui, o drama não mais representa a saga heróica da nobreza, mas sim estabelece diálogo direto com a revolução da classe burguesa sem que se prenda na ditadura do tempo, ou no seu espaço épico.

Nesse sentido, é de interesse destacar a presença do MARIDO e da MADAME, esses personagens fundamentam com excelência a busca de Brecht em questionar as ações da nobreza e sua prática conveniente. Sobretudo por que é perceptível o recorde social que os personagens abordam: a sociedade nobre sendo obrigada a suportar e conviver com a classe burguesa em processo de estabelecimento. A MADAME, mas que o MARIDO, censura as práticas da burguesia como podemos observar no diálogo em que ela critica a forma artesanal com que os móveis dos noivos foram feitos, destacando que o tipo de carpintaria usada na produção da cristaleira já não estava na moda, mas mostrando bastante interessante em conhecer o interior do móvel, sobre outra justificativa que não a de comparar a posição social de ambas as famílias no que diz respeito aos bens materiais. Os móveis feitos a mão configuram-se como a analogia que o dramaturgo alemão faz ao comportamento coercitivo da sociedade para com o indivíduo, pois à medida que as revelações aparecem, um móvel é quebrado na ação dramática, como se a cada móvel quebrado um valor social burguês fosse perdido. A verdade se revela distinta das aparências mostradas no início da festa. Assim, Brecht em sua narrativa linear e desdobrada estimula a queda das máscaras, mostrando através de suas personagens a tendência naturalista e pouco heróica de seu drama moderno.

O PAI DA NOIVA, O NOIVO, SEU AMIGO, A MADAME, SEU MARIDO, O MOÇO, A MÃE DO NOIVO, A NOIVA e SUA IRMÃ, assim as nove personagens nos são apresentadas, sem um nome próprio e sem características, apenas sujeitos comuns dentro da ação dramática presente e presença. Contribuindo para o distanciamento necessário à análise crítica.

O autor, com essa medida, impede que as personagens cresçam além do tema, fazendo com que o espectador não se fixe apenas a uma representação, mas se lance ao conhecimento da obra como unidade. O importante não é se envolver com a personagem, mas se debruçar sobre o tema que a obra abarca.

Em síntese, a peça reflete a preocupação do dramaturgo em reinventar, ou melhor, solucionar os problemas do drama clássico. O casamento do pequeno burguês é a prova irrefutável de que a há como revolucionar a linguagem cênica, especialmente em textos que abordam os conflitos sociais e históricos sob uma leitura marxista, como é o caso desse de Brecht, cuja simpatia em relação ao marxismo nunca foi escondida. A comédia do autor é atual, contemporânea e viva. Sua representação se vale do naturalismo, suas personagens são realistas, inclusive o protagonista. É a vida como ela é sendo encenada com a mais critica das maneiras. Aqui falamos não apenas da arte, mas de seu papel elucidador, de sua função social e política para a formação do indivíduo. Para Brecht, teatro e ciência devem dialogar em benefício da sociedade e de sua reformulação, rompendo com os limites do já estabelecido, sem ignorar a importância do tradicional para o moderno, reinventando-o apenas.